“A Roda da vida” e o abandono parental: livro aborda o tema de forma inédita ao público jovem

Ainda pouco debatido no Brasil, o abandono parental atinge cerca de 47 mil crianças e adolescentes, que vivem em abrigos no território nacional, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O problema é atual, mas não é novo. Há mais de cinco séculos atrás, instituições de caridade (especialmente abadias, igrejas e centros de acolhimento) criaram um dispositivo que ficou conhecido como a Roda dos Expostos. Era uma portinhola giratória onde recém-nascidos podiam ser deixados pela mãe. Essas crianças eram postas para adoção, mas muitas delas passavam a infância inteira aos cuidados da instituição, até se tornarem independentes. É difícil dizer quando a roda surgiu: alguns arquivos apontam que a primeira foi fundada em Portugal, em 1498, enquanto outras fontes dizem que o método de acolhimento já era utilizado na Itália do século XIII.

Autor consagrado de livros infanto-juvenis, Manuel Filho aborda de forma inédita essa questão no livro A Roda da Vida, ilustrado por Guilherme Petreca e lançado pela Panda Books. A obra traz a história de Ricardo, um jovem de 15 anos que recebe de seu avô Aparecido uma carta que revela a verdadeira origem de sua família.

Sempre de maneira muito sensível, Roda da Vida fala sobre a questão do abandono parental.

 

Em entrevista ao Panda News, o autor conta ter descoberto a existência da Roda dos Expostos ainda jovem (e ter ficado muito curioso e ao mesmo tempo assustado).  O processo de produção do livro foi baseado principalmente em arquivos históricos e na leitura de cartas deixadas por jovens nas instituições de caridade que visitou. “As pessoas que foram abandonadas na Roda já são muito idosas e difíceis de entrar em contato”, justifica Manuel. “O material de ficção a respeito da Roda é muito escasso e o livro pode ser uma boa oportunidade para quem quiser conhecer a história, por muitas vezes trágica, por meio da literatura”.

Falando sobre a questão do abandono parental nos dias de hoje, Manuel defende que o assunto ainda precisa ser muito debatido, pois o abandono segue ocorrendo sob as mais variadas formas. “Mesmo crianças que possam ter a presença de pai e mãe não estão totalmente protegidas da falta de atenção, da violência, do abandono parental, tão comum atualmente”, analisa. Em relação às políticas públicas voltadas para a área, o autor argumenta: “ao se ‘abandonar’ investimentos que poderiam provocar a diminuição da desigualdade social, cria-se uma reação em cadeia que, certamente, irá colaborar para que mais e mais crianças permaneçam desassistidas em nosso país”.

 

A Roda dos Expostos no Brasil

No Brasil, a Roda dos Expostos tem seu surgimento datado na primeira metade do século XVIII, nas Santas Casas de Misericórdia de Salvador (1726) e Rio de Janeiro (1738). Com o passar do tempo, questões como a falta de recursos e o surgimento de ideologias higienistas fez com que as Rodas dos Expostos lentamente começassem a desaparecer.

A última Roda dos Expostos a ter sido fechada no mundo foi brasileira. Localizada em São Paulo, a roda da Santa Casa de Misericórdia foi desativada em 26 de dezembro de 1960.

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