Gabriela Romeu trabalhou na Folha de S. Paulo por 21 anos. Uma de suas atividades no jornal foi escrever para o caderno infantil Folhinha. Ali, em 2009, ela coordenou o projeto “Mapa do Brincar”, vencedor do Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo na categoria Internet. Gabriela pediu que crianças de todo o país falassem sobre suas brincadeiras e recebeu cerca de 10 mil participações por cartas e e-mails. Ainda houve uma segunda edição dois anos depois e, na sequência, a autora criou outro projeto chamado Infâncias, onde buscou registrar a sabedoria das crianças pelo Brasil. “Foi um retrato da infância no início deste século”, explica.
Os trabalhos proporcionaram viagens por 25 dos 26 estados brasileiros – ainda falta Roraima. A jornalista andou de avião, ônibus, carro, barco, canoa e carona para entrar em contato com infâncias das mais diversas realidades. Ela abre um sorriso para falar de cada uma das viagens, mas a região entre Minas Gerais e Bahia, do Vale do São Francisco e do Vale do Jequitinhonha foram diferentes: “Eles têm meninos com pé no chão de terra, que sabem todos passarinhos só de ouvi-los cantar. Essas crianças me ensinaram muito”.
Foi quando o livro Menininho, publicado pela Panda Books, começou a surgir entre as ideias da autora. Gabriela lembra de Maneloião, um homem de Matias Cardoso, Minas Gerais. Adulto, lidando com a sobrevivência no dia a dia, relembrou os carrinhos que construía na infância. “Ficamos uma tarde conversando com ele, enquanto fazia um carrinho para mostrar como é.” No livro, o menininho tem um tio que transmite o mesmo conhecimento. O saber do personagem foi inspirado em Maneloião, mas seu jeito de ser não: “O tio é meio doido”, brinca a autora. Gabriela explica que nessas brincadeiras de construir algo, a graça realmente é montar, o resultado logo é deixado de lado. “Precisamos aproximar a infância urbana desses processos”.
Segundo a autora, brincar é uma linguagem de expressão importante: “É ali que a criança coloca para fora o que está dentro dela e relaciona com o mundo externo.” No Cariri cearense, Gabriela viu meninos usando pedras para fazer os papeis de bois, garrotes e bezerros. Os meninos eram fazendeiros e boiadeiros, pessoas que fazem parte de suas rotinas. O cenário foi construído com o que havia no quintal, como terra e feno. “Eles precisavam levar os animais para uma parte específica da fazenda, mas, às vezes, um boi fugia, e eles tinham que ir atrás”, recorda.
O Meninho é filho de muitas dessas crianças. O personagem principal recolhe coisas do quintal para construir seus brinquedos e se divertir. Com uma linguagem poética e acompanhado das ilustrações de Elisa Carareto, o livro faz um paralelo entre a criança e um passarinho, que também precisa buscar no quintal elementos para construir seu ninho.