O jornalista escocês Andrew Jennings, o inimigo número 1 da FIFA e de cartolas como João Havelange, Joseph Blatter e Ricardo Teixeira, morreu no dia 8 de janeiro, aos 78 anos. Jennings já havia investigado a máfia italiana, o Comitê Olímpico Internacional e até a corrupção dentro da Scotland Yard. Mas comprou a maior de suas brigas, contra a FIFA, em 1999. Revelou como as eleições internas são manipuladas, como funciona a compra de direitos de transmissão e até as negociatas para a escola do país-sede de uma Copa do Mundo. Jennings foi o primeiro jornalista da história a ser banido de todas as instalações, de todos os eventos e de todas as entrevistas coletivas da entidade sediada em Zurique, na Suíça. Seus dois principais livros – “Jogo Sujo” e “Um Jogo Cada Vez Mais Sujo” – foram publicados pela Panda Books. O diretor editorial Marcelo Duarte deu um depoimento sobre os tensos bastidores para publicação das duas obras:
“Na cobertura da Copa da África do Sul, em 2010, eu descobri numa livraria de Joanesburgo o livro ‘Foul!’, do repórter investigativo escocês Andrew Jennings. A orelha dizia que o livro tinha sido traduzido para 12 línguas e foi transformado em documentário pela BBC. ‘Foul!’ acabou sendo a minha leitura no voo de volta. Devorei o livro e, ao chegar em casa, escrevi para o próprio Jennings. Negociei com ele os direitos para a publicação da obra em português. O livro foi lançado no Brasil com o nome de ‘Jogo Sujo – O mundo secreto da FIFA: Compra de votos e escândalo de ingressos’. As denúncias foram o estopim para a maior investigação do submundo do futebol, que acabou com a prisão de vários dirigentes. Jennings esteve no Brasil para um seminário sobre jornalismo investigativo e tive o privilégio de conhecê-lo. ‘Jogo Sujo’ serviu de inspiração para muitos outros livros investigativos de futebol que vieram logo depois.
No final de 2013, Jennings me escreveu para avisar que estava trabalhando em um novo livro, uma espécie de continuação do primeiro , mas com bastidores de corrupção envolvendo também a Copa do Mundo de 2014, no Brasil. Queria que o livro fosse publicado primeiro aqui e só depois no resto do mundo. Para conseguirmos lançar a obra antes da Copa, ele teve que ir mandando os capítulos aos poucos, à medida que ia terminando. A Panda Books agendou o lançamento de ‘Um jogo cada vez mais sujo – O padrão FIFA de fazer negócios e manter tudo em silêncio’ para 5 de maio. No dia 22 de abril, eu enviei o capítulo 7 (‘Você quer comprar ingressos para a Copa do Mundo?’), que detalhava a ação da máfia de desvio e revenda de ingressos, para o jornalista Juca Kfouri, blogueiro do UOL, como estratégia de divulgação. No dia seguinte, começamos a receber pesadas ameaças de dois escritórios internacionais de advocacia que representavam a FIFA e o Comitê Organizador. Mas resolvemos confiar e bancar a apuração de Andrew. A Panda Books colocou o livro no mercado com o coração na mão.
Uma semana antes da final da Copa, Raymond Whelan, CEO da Match, empresa que tinha exclusividade para venda de camarotes e pacotes corporativos em eventos da Fifa, foi detido em operação da Polícia Civil do Rio de Janeiro. As denúncias do livro ‘Um jogo cada vez mais sujo’ estavam ali todas confirmadas. Mais um golaço de Jennings.”
Jennings irá fazer muita falta a quem torce pelo lado limpo do futebol. Morreu no sábado, dia 8 de janeiro, aos 78 anos.