A Revolução de 1932 de A a Z

Por que o 9 de julho é uma data tão importante para o estado de São Paulo? Esse dia batiza uma das principais avenidas da capital e é feriado em todo o território paulista. Em 9 de julho de 1932, São Paulo se transformou num verdadeiro campo de batalha, e a população pegou em armas para lutar contra o Governo Provisório de Getúlio Vargas e a favor da promulgação de uma nova Constituição.

Ricardo Della Rosa, autor de “Revolução de 1932”. Foto: Divulgação.

Para você conhecer alguns dos mais curiosos detalhes da Revolução Constitucionalista de 1932, o Panda News preparou um A a Z, com base nas informações que estão no livro Revolução de 1932, de Ricardo Della Rosa. Com 128 páginas e 450 imagens inéditas, a obra revela uma faceta pouco explorada sobre o conflito. Há ainda uma edição especial de colecionador, que acompanha 10 fac-símiles.

A – Armas de fogo

Antes de a Revolução de 1932 estourar, a produção bélica de São Paulo se resumia a 25 mil cartuchos e 25 mil granadas de mão por dia. O conflito provocou uma intensa mobilização industrial na região de São Bernardo, que elevou os números diários para 220 mil cartuchos e 220 mil granadas. Profissionais da Escola Politécnica e do Instituto de Engenharia colaboraram com o desenvolvimento de projetos de armas mesmo sem dominar essas técnicas. No fim das contas, São Paulo desenvolveu morteiros, bombadas, espingardas e até um lança-chamas.

B – Brasão

Quando a Revolução despontou, a bandeira de São Paulo e o brasão de armas da cidade foram logo adotados como símbolos pelos combatentes e simpatizantes. Mas a comissão de propaganda tratou de providenciar a arte que representaria o Estado como um todo, e transformou um desenho criado pelo artista plástico José Wasth Rodrigues no brasão do Estado de São Paulo, instituído por decreto governamental ainda em 1932.

C – Campanha do Ouro

Um crowdfunding para a Revolução! Esse seria o slogan da Campanha do Ouro, caso a Revolução de 1932 tivesse ocorrido nos tempos atuais. Lançada em 8 de agosto de 1932, a Campanha do Ouro Para o Bem de São Paulo arrecadou dinheiro, alianças, pedras preciosas e diversos objetos de valor do povo paulista. Os itens eram revertidos em medicamentos, armas, alimentos, produtos de higiene e uniformes para os soldados do front.

D – Desigualdade, Discrepância e Diferença

A discrepância entre as forças paulistas e as federais era tão grande que é de se espantar que os combates tenham persistido por tanto tempo. Foram cerca de 40 mil combatentes armados do lado do Estado de São Paulo contra 300 mil a 350 mil homens federalistas. Havia também notável diferença no preparo dessas tropas. Estima-se que 25 mil dos soldados paulistas eram voluntários sem o mínimo treinamento específico para a guerra, enquanto o lado federal era composto em sua totalidade por integrantes do Exército, da Marinha, das polícias estaduais e da Aviação.

E – Estrangeiros

As colônias estrangeiras que viviam em São Paulo colaboraram com o Movimento Constitucionalista, cada uma à sua maneira: de modestas arrecadações materiais ao alistamento de voluntários para os batalhões civis. Os italianos, por exemplo, arrecadaram bastante dinheiro para a Revolução. Já a colônia síria contribuiu com a produção de capas impermeáveis para proteger os soldados. Os alemães entregaram cinco ambulâncias moderníssimas, montadas e equipadas.

F – Feminina

A Revolução de 1932 provocou uma união feminina sem precedentes na história do Brasil. No total, mais de 70 mil mulheres trabalharam como voluntárias em oficinas de costura, na Cruz Vermelha, no Departamento de Assistência aos Feridos, na Campanha do Ouro, em postos de enfermagem e na produção das marmitas dos combatentes.

G – Getúlio Vargas

Em 1930, o então governador do Rio Grande do Sul Getúlio Vargas liderou um movimento armado que culminou num golpe de estado que depôs o presidente em exercício, Washington Luís, impediu a posse do presidente eleito, Júlio Prestes, e instituiu um Governo Provisório. No ano seguinte, uma grave crise econômica, que assolou São Paulo e levou o desemprego a patamares até então desconhecidos, foi o estopim do processo de ruptura dos paulistas com o governo Vargas, que culminou na Revolução de 1932.

H – Herói

A lei 12.430, de 20 de junho de 2011, inscreveu os nomes de Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo como heróis paulistas da Revolução Constitucionalista de 1932, no Livro dos Heróis da Pátria. Mas outro nome, menos conhecido do público, também ficou marcado como um grande herói da Revolução. Durante o conflito, o jornalista Ibrahim de Almeida Nobre, membro da Academia Paulista de Letras, não se limitou a atuar na sua área; também realizou discursos em comícios, convocou a participação popular e se alistou para o front, atuando em um batalhão que acabou batizado com seu nome: o Batalhão Ibrahim Nobre, da Frente Sul.

I – Improviso

Com o dinheiro curto e pouca estrutura, a Revolução de 1932 ficou marcada pelos improvisos. Um deles merece destaque: a dedicação de obstinados engenheiros a blindar trens para serem usados em combate no interior paulista – possível porque boa parte da luta se dava perto das estradas de ferro: a Sorocabana, a Mogiana, a Central do Brasil. Esses veículos, que se tornaram mitológicos, foram talvez a arma mais eficaz dos revolucionários contra as tropas de Getúlio Vargas.

J – Júlio Prestes

Quando a Revolução de 1932 aconteceu, Júlio Prestes de Albuquerque já era uma personalidade influente. Entre 1927 e 1930, foi presidente do Estado de São Paulo – cargo equivalente ao atual governador. Em 1930 seria eleito presidente do país, impedido de ocupar o cargo por causa da Revolução de 1930. Em 1932, Prestes estava exilado. Mesmo longe, apoiou fervorosamente o Movimento Constitucionalista.

K – Klinger

Um dos principais nomes militares da revolta, o general Bertholdo Klinger era comandante do estado do Mato Grosso quando se distanciou do grupo político que apoiava o Governo Provisório de Getúlio Vargas e se juntou aos conspiradores constitucionalistas. Já no Comando Supremo do denominado Exército Constitucionalista, foi responsável direto pelo estopim do conflito. Uma carta ofensiva que ele enviou ao então recém-nomeado Ministro da Guerra, general Inácio do Espírito Santo Cardoso, sinalizou ao Governo Provisório a intenção de deflagração do levante. Em 8 de julho, Klinger foi afastado de seu cargo oficial e, no dia seguinte, deu-se início à revolta.

L – Lei

A Revolução de 1932 é também conhecida por Revolução Paulista e Revolução Constitucionalista – este último, por um motivo bem claro: seus apoiadores lutaram pela volta do país ao império da Lei, demandando eleições e uma nova Constituição (que nada mais é do que o conjunto de normas que regem um Estado). O objetivo não foi conseguido de imediato, mas em 1934, depois de muita pressão popular, o governo de Getúlio Vargas finalmente promulgou uma nova Constituição.

M – MMDC

Criada em 24 de maio de 1932, a MMDC foi uma poderosa organização civil montada para apoiar os paulistas durante a Revolução. Faziam parte dela pessoas influentes nas academias, na política, na indústria e no comércio, mas seu nome acabou se tornando a sigla MMDC em homenagem aos jovens mortos em 23 de maio, na véspera de sua fundação. Assassinados por tropas federais em meio a uma manifestação, Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo são considerados os mártires do Movimento Constitucionalista de 1932.

N – Nove de Julho

A Revolução Constitucionalista teve início oficial em 9 de julho de 1932, cinco dias antes da data prevista. A estratégia de antecipação do conflito era arriscada, mas tinha objetivos maiores: ajudar a reverter a situação do general Klinger, que havia perdido suas tropas no Mato Grosso, e inflamar o clamor popular, para atrair mineiros e gaúchos à luta. A data é tão significativa para a história de São Paulo que, desde 1995, o 9 de julho é considerado feriado civil estadual.

O – Obelisco

Inaugurado em 1960 na cidade de São Paulo, o Obelisco Mausoléu ao Soldado Constitucionalista – mais conhecido simplesmente como Obelisco do Ibirapuera – é a grande homenagem aos que morreram na Revolução de 1932. O conjunto artístico e arquitetônico projetado por Galileo Emendabili tem 68 metros de altura e exatos 1.932 metros quadrados de área construída, em referência ao ano da Revolução. O número 32 ainda aparece – não por acaso – na metragem da largura da cripta e no número de projéteis esculpidos em mármore exibidos em sua fachada.

P – Propaganda

Incisivos, os cartazes que convocavam voluntários a engrossar as fileiras de combate em 1932 eram eficientes obras do Departamento de Propaganda da MMDC. O mais famoso desses cartazes dizia: “Você tem um dever a cumprir. Consulte sua consciência”. Os distintivos também funcionaram como peças de propaganda: criaram-se mais de duzentos tipos diferentes, com as bandeiras de São Paulo e do Brasil, o brasão de armas paulista e slogans como “Tudo por São Paulo”.

Q – Queda da Bastilha

Inicialmente, a Revolução de 1932 estava programada para estourar em 14 de julho, numa homenagem à Queda da Bastilha. Ocorrida em 14 de julho de 1789, a invasão da Bastilha e a consequente Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão marcaram a fase inicial da Revolução Francesa, que provocou uma transformação épica na França e em toda a Europa, com a derrubada dos antigos ideais da hierarquia aristocrata e a imposição dos novos princípios de liberdade, igualdade e fraternidade.

R – Revolução

O termo “revolução” ganhou conotação política no século XVII, quando passou a ser usado para indicar acontecimentos capazes de abalar a ordem social de uma nação. A Revolução de 1932 acabou sendo sufocada pelas tropas de Getúlio Vargas, mas, do ponto de vista político, o que se viu foi o fortalecimento do projeto liberal e constitucionalizante, tão almejado pelos paulistas.

S – São Paulo

Com quase 46 milhões de habitantes e uma economia que responde por 32,5% do total de riquezas produzidas no país, São Paulo é o estado mais populoso e desenvolvido do Brasil. A Revolução Constitucionalista, considerada o maior movimento cívico da história de São Paulo, provou que, desde aquela época, o estado já era uma potência industrial. Organizada pela Federação das Indústrias de São Paulo em parceria com a Associação Comercial, a mobilização para armar os combatentes paulistas aumentou a produção bélica do estado em 10 vezes.

T – Tecnologia e Técnica

Criada pelo Instituto de Engenharia e pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Comissão Inspetora das Delegacias Técnicas (CIDT) forneceu serviços de engenharia tecnológica à força revolucionária. Os cerca de 250 graduados em engenharia que se inscreveram no programa produziram mapas de estradas, construíram e conservaram campos de aviação, instalaram linhas telefônicas e telegráficas e fizeram até um sistema de purificação de água para abastecer as tropas no front.

U – Uniforme

Fabricado em São Paulo durante a Revolução, o uniforme de voluntário paulista era composto por uma camisa cáqui com acessórios em lona e a patente bordada costurada na manga, braçadeiras de pano, cobertura cáqui para a cabeça (popularmente chamada de “capacete de pano”), porta-munição de pano, cinto de couro com coldre e porta-ferramentas, saco de pano para itens de primeiros-socorros e pulseira de identificação do combatente. No kit de utensílios distribuído aos voluntários, havia uma bússola, um cantil de metal, uma pá de trincheira e facões.

V – Voluntários

O voluntariado foi uma das peças-chave que possibilitaram que a Revolução de 1932 de fato acontecesse. Além do papel prestado nos campos de batalha, na produção industrial, na propaganda e nos serviços de necessidade básica, o movimento voluntário atuou também na reposição da Força Pública, que se viu desfalcada com o empenho de seus membros em participar da guerra. Durante o conflito, funcionou em São Paulo uma organização denominada Serviço de Policiamento Civil, que atuou de forma voluntária com o objetivo de evitar as ações de gatunos, ladrões e larápios oportunistas.

X – Xavantes

Os batalhões formados nas cidades do interior paulista foram de extrema importância para que as forças da Revolução atingissem de forma expressiva o território estadual. Um dos palcos de batalha foi a pequena cidade de Xavantes, localizada na divisa com o Paraná – ponto estratégico para a contenção das tropas federais. Nas margens do Rio Paranapanema, soldados paulistas se punham a postos, à espera da invasão gaúcha. Hoje, no local, jaz uma pedra com uma mensagem escrita por um soldado constitucionalista com a sua baioneta.

W – Winchester

Durante a Revolução de 1932, foram incorporadas ao arsenal dos combatentes várias carabinas Winchester modelo 1892, arma pesada, não necessariamente adequado ao meio urbano. Parte delas foi doada pela população civil ao esforço constitucionalista, enquanto outras foram requisitadas aos estabelecimentos comerciais de caça e pesca. Se não bastasse, vários voluntários se apresentaram para o serviço militar usando suas próprias Winchesters – são famosas as fotos feitas nas imediações da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, com estudantes armados com elas.

Y – Ypiranga

Foi exemplar a atuação dos Correios durante a Revolução de 1932: estivesse onde fosse, se vivo, o combatente destinatário de uma carta a receberia, em mãos. Detalhes cuidadosos como cartões-postais temáticos e selos especiais tornaram o movimento ainda mais memorável para aqueles que arriscavam se corresponder. A gráfica Ypiranga se dispôs a imprimir de forma voluntária uma série de selos desenhada especialmente para a ocasião, que circulou oficialmente até o final de 1932 (e hoje, é claro, é item de colecionador).

Z – Zona de combate

De 9 de julho a 2 de outubro de 1932, o estado de São Paulo viu proliferarem-se zonas de combate em seu território. Muitas cidades do interior foram completamente invadidas tanto por tropas paulistas como por federais. A MMDC ficou responsável pelo amparo às famílias denominadas “retirantes de zonas de combate”. Quando a situação se complicou em determinadas cidades – como Areias, Buri e Queluz, que acabaram sitiadas –, moradores eram encaminhados para a retaguarda e a organização os auxiliava.

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