Como é que se faz a gravação de um audiolivro?

Nos primeiros meses de 2020, o radialista Eduardo Barão e a Panda Books mergulharam juntos em um projeto ambicioso: gravar o audiolivro Eu sou Ricardo Boechat. A editora escolheu esse título para estrear sua parceria com o serviço de streaming Ubook não por acaso: o jornalista biografado tinha uma voz inconfundível, assim como é a de Barão, coautor do livro. Para os fãs, seria especial ouvir na voz do colega de trabalho e amigo de Boechat as divertidas e emocionantes histórias de sua vida.

Apesar de sempre ter trabalhado com a voz, Barão encarou a tarefa como um desafio. “Tinha dúvidas principalmente sobre como interpretar as falas de Boechat”, lembra. Mas uma intercorrência do acaso deu um toque especial à gravação: no meio do trabalho, estourou a pandemia do coronavírus e o estúdio da Ubook teve que fechar as portas. Barão correu para sua segunda casa – a Band News FM – e conseguiu autorização para terminar lá sua missão. “Muitos que me ouviram durante esse processo lembraram de histórias que o próprio Boechat tinha contado no ar”, lembra, com carinho.

Cris Albuquerque, gerente de conteúdo editorial da Ubook.

Gerente de conteúdo editorial da Ubook, Cris Albuquerque explica que, além das pessoas com deficiência visual, o formato tem sido procurado por quem não quer ficar longe dos livros, mesmo quando não pode segurá-los para ler, como no trânsito e até na hora da faxina. Ela contou ao Panda News como é feito um audiolivro e por que ele é diferente de outras produções em áudio.

Leitura. Na primeira etapa, os produtores leem uma parte do livro para entender quais as características deverão buscar no narrador. “Geralmente só uma pessoa grava o texto todo. Mesmo que tenha muitos personagens, a história traz uma voz central”, explica. Este é o ponto que define se um audiolivro terá sucesso ou não. As buscas são feitas no banco de vozes da empresa – um registro de narradores com suas características. Eles nem sempre encontram alguém nos arquivos, então procuram atores, personalidades, locutores ou outros bancos.

Há os casos em que os próprios autores fazem a narração, como em Eu sou Ricardo Boechat. “Quem escreve traz uma verdade para a leitura e tem mais liberdade.” Quando outra pessoa faz a narração, ninguém mexe em nada do texto. Porém, livros com tabelas ou notas precisam de edição: “A gente trabalha essa parte, envia para a editora e pede autorização. Se for o autor, ele faz o que quiser.”

Teste de voz. Nesta etapa, a pessoa selecionada recebe um trecho do texto para ler. Se for aprovada, a produção compartilha com a editora. “Fora o autor, ninguém conhece melhor um livro do que quem o edita”. Por isso, Cris considera importante só gravar depois deste passo.

Gravação. A entonação de audiolivros tem características próprias: “Não é uma peça de teatro e nem um documentário. O ideal é que a leitura seja natural para transmitir sinceridade”. Cris ainda conta que cada sessão de gravação tem, no máximo, três horas. A voz e o cansaço mental impossibilitam períodos mais longos.

Revisão. Os audiolivros costumam ter entre 6 e 10 horas. “É impossível não ter que regravar”. Alguma palavra pode ficar incompreensível, acontecem problemas de pronúncia com termos estrangeiros. Até se a barriga do narrador roncar durante uma fala, o barulho aparece, e o trecho é refeito. A edição também é revista.

Finalização. Nesta última etapa, o objetivo é a homogeneização do conteúdo. “Por exemplo, o narrador pode se aproximar mais do microfone em uma palavra. Isso muda o volume naquele trecho”, explica Cris, justificando correções realizadas com o uso de software.

Todas as etapas envolvem treinamento de novos profissionais, numa área onde ainda há poucas pessoas especializadas. “Não é só pegar o texto e sair lendo. A edição e a revisão também têm características próprias. Nossa vida é treinar gente. Eu gosto bastante”.

Clique aqui para mais informações sobre o audiolivro Eu sou Ricardo Boechat, de Eduardo Barão e Pablo Fernandez. A coleção Hora do medo também está disponível no site e no aplicativo da Ubook.

Dia do Cordelista: Uma festa de rimas e ritmos

Certa vez uma criança
Disse: — O poeta me deve
Uma história em cordel,
Bonita, atraente e leve.
Quando perguntei: — Qual era?
Respondeu: — Branca de Neve!

Em 19 de novembro, comemora-se o Dia do Cordelista, homenagem a Leandro Gomes de Barros. Considerado criador do gênero, o poeta inovou com rimados textos populares bem humorados e na publicação de suas obras – criou uma gráfica para imprimi-las e viajava pelo sertão para divulgar o trabalho.

O escritor Varneci Nascimento sempre comemora essa data. Natural de Banzaê, cidade baiana a 300 quilômetros de Salvador, cresceu cercado por tradições locais, como o “batalhão” – dezenas de homens se unem para realizar trabalhos em sítios e fazendas de amigos. Nesses encontros, quando o suor dá lugar ao descanso, começa uma cantoria feita de improviso. “Os repentes do Nordeste costumam usar viola, mas a gente batia enxada no chão para fazer o ritmo”, conta o autor, que, em parte da vida, dividiu o gosto por cantar com a leitura de cordel, uma influência do pai. Varneci cursou História na faculdade, mas sempre trabalhou como escritor de cordel, onde juntou suas habilidades artísticas. Pela Panda Books, publicou duas adaptações de clássicos mundiais: Branca de Neve e O Pequeno Polegar.

Qual é a importância do cordel para a nossa literatura?

O cordel cativa com as rimas, os ritmos e a beleza de toda a sua construção. É uma delícia de ler! Esse gênero tem um grande poder de atração, ele pode transformar alguém que não gosta de ler em apaixonado por livros. Minha namorada é professora, ela lê para as crianças O Pequeno Polegar e Branca de Neve. Quando pega o texto em prosa, os alunos logo pedem: “Não, professora, a gente não quer assim, a gente quer do outro jeito”. Olha como eles gostam! Mas também não é brincadeira ler um clássico na escola. Eu sempre peço para os educadores falarem de cordel quando realmente se apaixonarem por ele. Com sinceridade, vão cativar os alunos.

Onde nasceu a literatura de cordel?

Algumas pesquisas dizem que ela surgiu em Portugal, no século XVII, mas o português não a mesma coisa que o nosso. Lá, era cordel só por estar pendurado num cordão – o cordel. Podia ter qualquer coisa escrita. A forma poética e o escrever rimado são do Nordeste. Uma vez, eu perguntei sobre isso para a professora Jerusa Pires Ferreira, pesquisadora da USP, que estudou o cordel em várias partes do mundo. Ela é baiana, como eu, e disse: “ixe, meu filho, lá é muito diferente!”. Hoje, nós não podemos dizer mais que o cordel é uma coisa só do Nordeste, tanto que foi tombado pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como patrimônio cultural do Brasil. O cordel também dialoga com o mundo por meio de expressões culturais, como a música e o cinema.

Como você comemora o Dia do Cordelista?

Desde 2013, eu vou a Natal (RN), onde acontece um grande encontro de poetas chamado “Ciclo Natalense do Cordel”. Esse ano ele terá que ser online. Também é um dia em que postamos bastante nas redes sociais, a gente faz muita zoada.

Todd Parr de A a Z

A Panda Books está preparando uma grande novidade para o final do ano: O livro da gentileza, de Todd Parr, estará disponível em livrarias físicas e virtuais a partir de dezembro. Para celebrar o lançamento do 20º livro de Todd no Brasil, o Panda News preparou um A a Z sobre o autor com detalhes curiosos de sua vida.

A – Arte

Todd Parr é artista desde criança. Aos 7 anos, ele ganhou um concurso de quadrinhos de um jornal americano. Já adulto, desenhava e pintava como hobbie. Até que passou a vender roupas estampadas com seus trabalhos. De repente, Todd estava criando coleções especiais para lojas importantes, como a Macy’s, e expondo seus quadros. Lançou uma linha de produtos infantis. O trabalho impressionou um editor de Nova York, que sugeriu que ele escrevesse livros para crianças.

B – Berkeley

A cidade de Berkeley foi fundada na Califórnia no século XIX para abrigar uma universidade com o mesmo nome. Além do ambiente universitário, ela ficou famosa ao longo do tempo por se posicionar a favor de causas como a proteção de imigrantes e de americanos que se recusaram participar da Guerra do Vietnã. É nesta cidade que Todd Parr vive atualmente.

C – “Com amor, Todd”

O autor tem uma forma especial de lidar com as crianças, que o permite falar sobre temas delicados com leveza. Um exemplo dessa característica está nos finais de seus livros. Todos terminam com uma mensagem carinhosa, direcionada aos pequenos leitores, seguida por: “Com amor, Todd”.

D – Dezoito anos no Brasil

O primeiro livro de Todd Parr lançado no Brasil foi Tudo bem ser diferente, em 2002, pela Panda Books. Ele logo conquistou crianças, pais e professores. O Panda News mostrou recentemente um caso do carinho que os livros de Todd recebem: a entrevista com a pediatra Fernanda Ribeiro, que indica leituras aos pacientes e defende a importância desse ato desde o desenvolvimento da fala. Ela começou a divulgar literatura para crianças pela internet justamente com Tudo bem ser diferente.

E – Escolas

É comum professores de educação básica trabalharem Todd Parr com as crianças. E Todd gosta de visitar os alunos nos Estados Unidos e em suas viagens, como fez no Brasil. O autor fez visitas a duas escolas em Brasília e em São Paulo, além de ter dado uma palestra no CEU Caminho do Mar, zona sul paulistana.

F – Flipiri

A Festa Literária de Pirenópolis (Flipiri), no interior de Goiás, foi o primeiro compromisso da visita que Todd Parr fez ao Brasil em maio de 2014. No evento, o autor realizou debates, promoveu uma oficina de ilustração e foi homenageado pelo prefeito com a chave da cidade – presente simbólico dado a pessoas que realizam feitos especiais aos cidadãos.

G – Guias de atividades

Em seu site oficial, o autor compartilha atividades para as crianças. A página é em inglês. Há desenhos para colorir – incluindo ilustrações de seus livros – e bonecos chamados paper dolls, feitos para imprimir, recortar e montar. Também há um guia de como criar o seu próprio livro.

H – Humor

Uma criança com cueca na cabeça é uma ilustração comum nos livros de Todd Parr. Com delicadeza e diversão, ele fala sobre assuntos como adoção, perda de alguém especial e ter dois pais ou duas mães.

I – It’s Okay to Be Different

Esse é o título original de Tudo bem ser diferente, o primeiro livro escrito por Todd Parr, publicado em 2001. A obra é um sucesso até hoje, e a tradução para o português está entre as mais vendidos da Panda Books. Em sua estreia, o autor escreveu sobre diferenças culturais, sociais, físicas e étnicas.

J – Julian

Todd Parr criou um desenho para televisão. O ToddWorld (Mundo de Todd) estreou em 2004 nos Estados Unidos e ficou no ar até 2008. Ele retratou personagens e cenários da mesma maneira dos livros. Entre os que fizeram parte da turma está Julian, um garoto que anda de cadeira de rodas e é artista. Sua primeira aparição foi no episódio “It’s Okay to Have Wheels” (Tudo Bem ter Rodas). No Brasil, ToddWorld foi transmitido pelo canal “Discovery Kids”. Em 2007, o desenho foi ao ar em Portugal pela emissora “Canal Panda”.

K – Keith Haring

O desenhista norte-americano Keith Haring (1958-1990) gostava de usar cores vivas e linhas pretas nas suas obras. Essa característica do artista é uma das principais influências de Todd Parr, que desenha em um tablet gráfico ligado a um computador.

L – Livros fáceis de ler

Durante a infância, Todd gostava de livros fáceis, especialmente os ilustrados. O autor considera importante que os adultos façam perguntas para as crianças quando estão lendo com elas – como de quais elementos elas mais gostam nas páginas e as cores que chamam mais atenção.

M – Mensagens para caridade

Todd gosta de ajudar instituições de caridade. Para contar com a parceria dos fãs, ele entrou para o site Cameo. Nele, é possível pagar por uma assinatura e receber mensagens e vídeos que o autor faz com exclusividade para os assinantes. Todo o dinheiro que ele ganha dessa forma é doado às suas instituições preferidas.

N – Nove de julho

Todd Parr nasceu em 9 de julho de 1962, em uma cidade chamada Rock Springs, no estado norte-americano de Wyoming. Ele mora na Califórnia desde 1995.

O – Otto

Uma das estrelas dos livros é o cachorro Otto. Todd adora bichos, especialmente os cães. Em sua visita ao Brasil, contribuiu com a União Protetora dos Animais de Pirenópolis (Upapiri) e adotou um cachorro que tinha sido atropelado – o autor cedeu suas obras para a criação de um calendário que foi vendido pela associação. Os lucros foram usados para sustentar o bicho, até ele encontrar um lar. Nos Estados Unidos, também há instituições para o cuidado de animais que recebem ajuda de Todd Parr. Atualmente, ele vive com três pit bulls bem dóceis resgatados na cidade onde mora – os cachorros se chamam Pete, Tater Tot e Jer-Jer. Otto só nos livros.

P – Pimentas

Todd adora cozinhar, e as pimentas estão entre seus temperos favoritos. Quando veio ao Brasil, em 2014, ele recebeu de presente da equipe da Panda Books um kit de pimentas tradicionais brasileiras, além de uma camisa da Seleção Brasileira com o número 10 e seu nome nas costas.

Q – Queijo

Todd adora queijo, ainda mais para comer com macarrão. Ele gosta tanto que compartilha duas receitas com o ingrediente em seu site. A paixão por massa aparece de uma forma divertida no primeiro livro: “Tudo bem comer macarrão com almôndegas na banheira”. Esse foi o menu de um almoço com jornalistas quando o autor esteve no Brasil – mas fora da banheira!

R – Reconhecimento

Todd Parr já recebeu seis prêmios como reconhecimento pelo seu trabalho. O destaque fica com O livro do planeta Terra, premiado duas vezes nos Estados Unidos. Ele também fez parte da famosa lista de mais vendidos do jornal The New York Times.

S – Sentimentos

Sentir-se com raiva, medo, angústia ou euforia é comum desde a infância. Mas para as crianças, dar nomes e entender esses sentimentos pode ser complicado. Em O livro dos sentimentos, de 2011, Todd Parr aborda diferentes emoções e explica cada uma delas aos pequenos leitores com textos e ilustrações simples e cativantes.

T – Tudo bem cometer erros

As crianças podem ficar constrangidas ao fazer algo errado. No livro Tudo bem cometer erros, Todd Parr mostra que não se deve ficar triste por esse motivo. Os erros podem ser uma fonte de aprendizado. O próprio autor passou por isso no início da carreira literária. Nos quadros, ele não usava pontuação quando escrevia frases, e seguiu com o formato nos primeiros livros infantis. Então, Todd percebeu que estava dando um mau exemplo. Atualmente, ele toma cuidado para que todas as suas obras tenham a pontuação correta.

U – United

Antes de ser autor de livros infantis, Todd Parr trabalhou como comissário de voo na companhia aérea United. O emprego foi a maneira que ele conseguiu para sair da pequena cidade onde morava. Passou 15 anos trabalhando para a empresa, e foi durante os horários livres das viagens que ele pôde desenvolver sua arte.

V – Vietnã

O Vietnã é um pequeno país asiático, que ao norte faz fronteira com a China. Ele possui uma rica cultura e belas paisagens naturais. O idioma oficial por lá é o vietnamita, que conta com traduções de livros de Todd Parr, feitas por uma editora chamada Crabit Kidbooks. O autor já foi traduzido para outras 14 línguas em quatro continentes diferentes.

W – Wyoming

O estado natal de Todd é o décimo maior dos Estados Unidos, mas tem uma população pequena por causa do clima árido, das grandes regiões montanhosas e da localização distante do litoral. As principais atividades econômicas do Wyoming são o turismo e a agropecuária.

X – Xangai

Todd Par já visitou a terra dos pandas: a China. Ele viajou para Xangai quando livros seus foram traduzidos para o idioma local. Lá, visitou crianças e tirou fotos dos ursos que são símbolo do país e o nome de sua editora no Brasil.

Y – Yellowstone

O estado onde o autor nasceu é o destino de muitos turistas, principalmente por causa do Parque Nacional de Yellowstone. Fundado em 1872, ele foi um dos primeiros do mundo a receber dinheiro público para proteger os animais e a vegetação local. Nele, os visitantes podem ver de perto animais como lobos, alces e ursos, além de 300 gêiseres, que dão um show natural de água quente lançada ao alto. Também é possível fazer trilhas, praticar canoagem, mountain bike e pesca esportiva.

Z – Zoo de Todd

Um dos livros de Todd a retratar animais é Zoo Do’s and Don’ts, com dicas divertidas sobre o que pode ser feito em um zoológico – e o que não pode de jeito nenhum. O autor sempre desenha animais de um jeito próprio – eles são coloridos, sorriem, ficam tristes e também possuem os traços simples que fazem sucesso entre as crianças.

Os quatro passos que transformaram um biólogo em youtuber

Guilherme Domenichelli vê Biologia em tudo. “Para se pendurar na árvore, o macaco fica com um braço em um galho, o rabo enrolado em outro e apoia onde mais puder. Se tiver problema em algum lado, o bicho não cai”. Essa tática do reino animal é uma comparação com a própria vida – atualmente, ele atua como palestrante; consultor ambiental; escritor (com quatro livros publicados pela Panda Books!) e virou youtuber. Seu canal Animal TV tem quase 700 mil inscritos. O autor deixou um emprego fixo este ano para se dedicar integralmente aos vídeos e conta como foi o processo.

1. Paciência e planejamento

O canal começou em 2016, com incentivo de uma amiga também youtuber. Já tinha a pretensão de fazer o Animal TV crescer, mas não imaginava que ele me manteria. O galho cresceu e ficou forte. Deu certo porque sempre teve planejamento em tudo, desde quando eu postava um vídeo por semana. Hoje, como tenho mais tempo, faço três. Precisa ter paciência no começo! Conheci canais legais que deixaram de existir por causa da demora para ter projeção e retorno financeiro.

2. O trabalho exige disciplina

Estou gostando de não ter mais chefe, horário certo para trabalhar, uso a roupa que eu quero e faço as coisas em casa – mas disciplina é tudo. Apesar de ser uma coisa sua, que você gosta de fazer, tem dias em que a gente não se sente bem, é normal. Às vezes, eu só quero assistir a um jogo da Champions League, mas, se bobear, perco o ritmo. Além disso, trabalho em finais de semana e feriados, porque procuro responder o máximo de comentários dos vídeos. Nos domingos, por exemplo, eu interajo com o pessoal de manhã e descanso no resto do dia.

3. Experiência com o assunto e cuidado na produção do conteúdo

Adoro ter contato com pessoas e ensinar Biologia. Então, isso acaba me ajudando. Como interajo com os seguidores, a maior parte dos vídeos são sobre temas sugeridos por eles. Também falo de assuntos que eu acho interessantes e notícias da semana. Costumo postar segunda, quarta e sexta, mas faço tudo sozinho, nem sempre dá tempo de seguir esse calendário. As pessoas me conhecem e sabem disso. Demoro para pesquisar cada assunto abordado e produzir o roteiro.

4. Respeito com os animais

Em parte dos vídeos, os animais aparecem comigo. Como estou na área há cerca de vinte anos, conheço pessoas de confiança que têm bichos legalizados, e eu também tenho alguns em casa, como jabutis e um teiú. Às vezes, acontecem situações engraçadas. Uma vez, por exemplo, eu gravei com uma iguana que ficou andando pelos meus ombros. Estava ocorrendo tudo bem, até que ela pegou no meu nariz e fez um buraco com a garra. Até brinco no vídeo que poderia colocar um piercing. São apenas sustos e ficam como cenas de bastidores divertidas do Animal TV.

Meninas nas Ciências: não é ficção científica, não!

A Netflix lançou recentemente A caminho da Lua. A animação conta a história de Fei Fei, uma garota que constrói seu próprio foguete para viajar ao satélite natural da Terra. Entre perdas, aceitação e conquistas, ela realiza inúmeros testes para que a sua criação decole. O longa reforça um conceito chamado STEM, sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática. As áreas têm sido cada vez mais difundidas entre os jovens em escolas e projetos de divulgação científica. Em muitos casos, as meninas são o foco de ações para estimular o aumento da participação feminina nas áreas abordadas.

Uma brasileira viveu todo o processo de encanto pela ciência desde a infância até chegar a um posto na NASA muito antes de surgir a sigla STEM. Duília de Mello era fã de filmes e séries que mostravam o que havia fora da Terra – desde a ficção de Star Trek às explicações reais e acessíveis de Carl Segan em Cosmos. “Eu sou fruto da ficção científica”, revela a astrônoma, que é vice-reitora da Universidade Católica da América, em Washington, e colaboradora da Agência Espacial Norte-Americana.

Duília foi uma das primeiras pessoas a fazer divulgação científica no Brasil, trabalho que conta no livro Vivendo entre as estrelas, publicado pela Panda Books. Na obra, ela explica o passo a passo que seguiu desde quando começou a se interessar pela carreira, até chegar à NASA. “Foi uma ideia inovadora, pois ainda não se falava em incentivar meninas para as áreas STEM”, afirma a autora, que viu o estímulo para as jovens surgir nos Estados Unidos por volta de 2009.

Sua geração foi a primeira a ter mulheres em cargos de chefia na ciência como algo comum. Ela cita como exemplo o próprio posto de vice-reitora e amigas que lideram laboratórios da NASA. A autora conta que a Agência Espacial Norte-americana tem um programa para incentivar meninas a se tornarem cientistas. Como parte dos resultados, há o aumento de mulheres em diferentes cargos da própria agência. “A sociedade não é feita só por homens, e as mulheres têm seu jeito de resolver problemas”, destaca Duília. “Por que também não nas áreas de STEM?”.

O maior desafio para se iniciar na astronomia é o tempo até a profissionalização: “Precisa fazer mestrado e doutorado. Da entrada na faculdade até um vínculo de trabalho, são 10 anos”. Depois de enfrentar esses desafios, Duília construiu uma carreira com diferentes realizações: já descobriu uma estrela, a Supernova 1997D, e participou da descoberta das Bolhas Azuis, aglomerados de estrelas fora das galáxias. Outro motivo de alegria para a autora é ver pessoas que decidiram estudar astronomia após lerem seu livro. Ela destaca Geisa Ponte e Ana Carolina Posses. As duas seguiram seus passos e se tornaram astrônomas: “Sou mãezona das minhas pupilas”.

Para incentivar as meninas hoje, cada vez mais obras estão sendo lançadas. Como em A caminho da Lua, o livro Ara – A engenheira das estrelas, também lançado pela Panda Books, conta a história de uma garota cientista. A autora Komal Singh é engenheira de software e gestora de programas no Google. Certa vez, sua filha de 4 anos perguntou: “Engenharia é coisa de menino, né, mamãe?”. O espanto foi tamanho, que estimulou o surgimento do livro. Ara é uma garota com o desejo de programar seu robô DeeDee para contar todas as estrelas que existem, mas não sabe muito bem como fazer isso. Então, ela entra em uma aventura com quatro superengenheiras que vão ajudá-la a realizar seu sonho – todas elas colegas de trabalho de Komal. Mulheres reais, como Duília.

Tiago Berg

O sabe-tudo de hinos e bandeiras do mundo inteiro

No dia 3 de julho de 1998, a seleção brasileira venceu a Dinamarca por 3 X 2 pelas Quartas de Final da Copa da França. Tiago José Berg tinha 14 anos, estava na 8ª série e vivia ainda em sua cidade natal, Cordeirópolis, a 164 quilômetros de São Paulo. Ele estava encantado. Apesar de o Brasil perder a final para os anfitriões, foi a Copa mais importante da sua vida. Foi quando TV Globo começou a exibir traduções de hinos nacionais tocados antes dos jogos.

“O hino dinamarquês fala que o país é a sala de Freya. Mas quem é ela?”. Tiago pesquisou e descobriu que se trata da deusa nórdica da fertilidade. Também soube que a Dinamarca definiu seu nacionalismo entre os séculos XVIII e XIX, quando houve um festival de música para escolher o hino. Uma canção estudantil se tornou muito popular e acabou vencedora.

Curioso, ele decidiu buscar hinos, bandeiras e brasões. Contou com a ajuda dos pais para escrever cartas a embaixadas de outros países. Também pedia para a mãe gravar as aberturas dos jogos em fita cassete e avisava: “Quero só os hinos, não precisa gravar o jogo”.

Conforme contatava as embaixadas, ele recebia diversos materiais, como bandeiras, partituras de hinos e cartões com fotos de líderes políticos – “Tenho um do casal que é dono de Lichtenstein. É curioso, Luxemburgo e Arábia Saudita também são países com famílias que os fundaram ou são praticamente donas”. No processo, acabou recebendo endereços de outras embaixadas e passou a conversar com entidades esportivas. Do Comitê Olímpico Internacional, veio um guia com endereços de representações oficiais que os países têm ao redor do mundo.

Logo foi buscar embaixadas fora do Brasil. “Aqui não tinha um representante da Namíbia, por exemplo, mas tinha em Washington.” Para escrever textos em outros idiomas, ainda na virada do século, ele juntou dinheiro e comprou um programa de computador que fazia traduções. Desses lugares, também recebeu materiais, todos guardados com cuidado até hoje. “Antes da internet, eu usava isso como garantia do meu trabalho”, revela.

Ao terminar a escola, pôde unir a paixão às possibilidades que a vida oferecia. Sem dinheiro para estudar em uma cidade distante, cursou Geografia na Unesp da vizinha Rio Claro. Com 12 quilômetros entre sua casa e a universidade, ia e voltava todos os dias. Lá, também fez mestrado e doutorado, sempre estudando símbolos nacionais. Hoje, é professor do Instituto Federal de São Paulo, no campus Capivari. É casado e mora em Piracicaba, a principal cidade da região.

Tiago publicou com a Panda Books os livros Hinos de todos os países do mundo (2008) e Bandeiras de todos os países do mundo (2013). Dois anos após o primeiro chegar às livrarias, recebeu um convite de Jô Soares para ir ao Programa do Jô. Com pouco mais de 20 mil habitantes, Cordeirópolis madrugou para assistir. Segundo ele, em cidades pequenas no interior ainda há mais resistência quando alguém tenta fazer algo diferente: “a entrevista foi boa porque mudou a percepção que as pessoas têm do meu trabalho”. Em 2011, o autor foi homenageado pela Câmara Municipal de Cordeirópolis com o Diploma de Gratidão do Município.

Além das informações completas, seus livros utilizam formatos originais. Bandeiras de todos os países do mundo lembra um álbum de figurinhas e traz não só os modelos atuais, mas também versões históricas utilizadas no passado.

Tiago sempre tem espaço para mais curiosidade. Durante a pesquisa com hinos, criou interesse pela vexilologia, o estudo das bandeiras. Ele participou de um congresso mundial sobre o assunto pela primeira vez em 2013, na cidade de Roterdã, Holanda. Lá, apresentou reflexões sobre bandeiras e paisagens. Ficou em uma mesa com representantes de Rússia, China e Índia – “Era um encontro do BRICS!”.

Em 2017, Tiago conseguiu participar pela segunda vez do Congresso de Vexilologia, agora em Londres, Inglaterra. Conheceu representantes da Geórgia e foi fazer amizade: “Perguntei se o nome do país em georgiano é Sakartvelo”. Ao receber uma resposta positiva, o autor cantou o Hino da Geórgia para os novos amigos. “Ficaram emocionados e me deram a bandeira deles de presente”. Na ocasião, também conheceu o autor polonês Alfred Znamierowski, que inspirou seu livro sobre bandeiras.

Durante o congresso, Tiago apresentou um trabalho que faz na escola e foi bem recebido pelos vexilologistas. Como exemplo, ele cita um projeto realizado durante a Copa da Rússia, em 2018. “Nós temos 27 unidades federativas, nos Estados Unidos são 50, na Rússia, 84.” Pediu aos alunos que pesquisassem e fizessem as bandeiras de todas essas regiões. Assim, conheceram melhor a diversidade e a geografia do país, além de desmistificá-lo. O trabalho virou uma exposição na escola, chamada “Bandeiras regionais da Rússia”.

Tiago tem um quadro na Rádio Educativa de Piracicaba, chamado Hinos do Mundo, foi curador de uma exposição sobre bandeiras durante a Copa de 2014 e quer fundar a associação de vexilologia do Brasil e ir para o YouTube com curiosidades relacionadas à geografia. “Por exemplo, em 1971, o Turcomenistão fazia parte da URSS. Foram perfurar um poço de gás por lá, e começou a pegar fogo. Não tinha como apagar e os soviéticos deixaram lá. Pega fogo até hoje.”

Como as crianças brincam em diferentes partes do Brasil

Gabriela Romeu trabalhou na Folha de S. Paulo por 21 anos. Uma de suas atividades no jornal foi escrever para o caderno infantil Folhinha. Ali, em 2009, ela coordenou o projeto “Mapa do Brincar”, vencedor do Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo na categoria Internet. Gabriela pediu que crianças de todo o país falassem sobre suas brincadeiras e recebeu cerca de 10 mil participações por cartas e e-mails. Ainda houve uma segunda edição dois anos depois e, na sequência, a autora criou outro projeto chamado Infâncias, onde buscou registrar a sabedoria das crianças pelo Brasil. “Foi um retrato da infância no início deste século”, explica.

Os trabalhos proporcionaram viagens por 25 dos 26 estados brasileiros – ainda falta Roraima. A jornalista andou de avião, ônibus, carro, barco, canoa e carona para entrar em contato com infâncias das mais diversas realidades. Ela abre um sorriso para falar de cada uma das viagens, mas a região entre Minas Gerais e Bahia, do Vale do São Francisco e do Vale do Jequitinhonha foram diferentes: “Eles têm meninos com pé no chão de terra, que sabem todos passarinhos só de ouvi-los cantar. Essas crianças me ensinaram muito”.

Gabriela Romeu, o "Menininho" e o carrinho de Maneloião
Gabriela, o “Menininho” e o carrinho de Maneloião

Foi quando o livro Menininho, publicado pela Panda Books, começou a surgir entre as ideias da autora. Gabriela lembra de Maneloião, um homem de Matias Cardoso, Minas Gerais. Adulto, lidando com a sobrevivência no dia a dia, relembrou os carrinhos que construía na infância. “Ficamos uma tarde conversando com ele, enquanto fazia um carrinho para mostrar como é.” No livro, o menininho tem um tio que transmite o mesmo conhecimento. O saber do personagem foi inspirado em Maneloião, mas seu jeito de ser não: “O tio é meio doido”, brinca a autora. Gabriela explica que nessas brincadeiras de construir algo, a graça realmente é montar, o resultado logo é deixado de lado. “Precisamos aproximar a infância urbana desses processos”.

Segundo a autora, brincar é uma linguagem de expressão importante: “É ali que a criança coloca para fora o que está dentro dela e relaciona com o mundo externo.” No Cariri cearense, Gabriela viu meninos usando pedras para fazer os papeis de bois, garrotes e bezerros. Os meninos eram fazendeiros e boiadeiros, pessoas que fazem parte de suas rotinas. O cenário foi construído com o que havia no quintal, como terra e feno. “Eles precisavam levar os animais para uma parte específica da fazenda, mas, às vezes, um boi fugia, e eles tinham que ir atrás”, recorda.

O Meninho é filho de muitas dessas crianças. O personagem principal recolhe coisas do quintal para construir seus brinquedos e se divertir. Com uma linguagem poética e acompanhado das ilustrações de Elisa Carareto, o livro faz um paralelo entre a criança e um passarinho, que também precisa buscar no quintal elementos para construir seu ninho.

Leitura sem fronteira: os livros da Panda Books publicados no exterior

Em setembro deste ano, a coleção Corpo Humano, da Panda Books, fez sua estreia na terra dos pandas. A incrível fábrica de cocô, xixi e pum, Em busca da meleca perdida, Pronto para o socorro e Viagem por dentro do cérebro (os três primeiros de Fátima Mesquita e o último do psiquiatra Daniel Martins de Barros) foram traduzidos para o chinês e publicados na China pela Publishing House of Eletronics Industry. Os pandas brasileiros vibraram com a notícia: agora, já são 51 edições internacionais de obras originais da Panda Books.

Fátima Mesquita
A autora Fátima Mesquita e seus livros traduzidos para o alemão e o chinês.

Pronto para o socorro, que ensina as crianças a lidarem com pequenos acidentes do dia a dia, já tinha sua versão em alemão. “É um delírio pensar que tem gente de países tão distantes e diferentes lendo o que uma mineira de Belo Horizonte escreve”, comemora a autora. “Me belisca que eu não estou acreditando!”. Sem deixar de lado a modéstia, Fátima admite que alguns pontos importantes fazem seus livros impressionarem olhares estrangeiros: a linguagem descompromissada, o caráter de literatura de referência e as ilustrações super originais – todas assinadas por Fábio Sgroi.

Ilustrador e pesquisador, Sgroi faz pensar em um detalhe interessante: desenho não precisa de tradução.  “A grande pergunta que surge na minha cabeça é: como será que a outra cultura vai entender as piadas que eu fiz aqui?”. Afinal, uma imagem não transmite informação sem contextualização. Enquanto os textos são vertidos para um novo conjunto de códigos e símbolos, quando se traduz uma obra ilustrada os desenhos são simplesmente reproduzidos, com exceção de pequenas adaptações gráficas feitas pelos próprios editores.

Há exceções, como o que aconteceu com a edição alemã de Pronto para o socorro. O livro foi adaptado para que o personagem principal fizesse referência a um médico famoso por lá, então Sgroi foi convocado a fazer algumas adaptações para que a figura se parecesse fisicamente com o tal doutor. “Para mim, isso é o de menos: o mais intrigante é pensar em como uma criança estrangeira vai interpretar o pé de jaca que ilustra a história”.

Outro best-seller da Panda, O que podemos aprender com os gansos atravessou as fronteiras da América Latina e chegou a Portugal. Por meio de parábolas, fábulas e outras histórias, a obra de autoajuda revela que o segredo da qualidade de vida e do sucesso profissional muitas vezes está nos detalhes mais simples do dia a dia. O autor, Alexandre Rangel, admira: “A gente vê que problemas do nosso cantinho brasileiro afetam pessoas em qualquer outro lugar do mundo.” Ele foi convidado para participar do lançamento em Lisboa, num evento voltado para o marketing em varejo, e contribuiu com uma palestra sobre liderança e motivação de equipes.

Completam o time de obras internacionais da Panda Books O homem irresistível, A mulher irresistível, O doce veneno do escorpião, O que aprendi com Bruna Surfistinha, Fábulas de Esopo para executivos, Como atirar vacas no precipício, Tudo o que sei sobre negócios aprendi com a pescaria, a coleção “Os endereços curiosos”, a coleção “Princesas do mar”, O livro dos grandes direitos das crianças, Neymar Jr. de A a Z, O menino, o jabuti e o menino, Flop, Como fazíamos sem e O livreiro do Alemão. Este último é especial: a edição francesa da autobiografia de Otávio Júnior, criador de um revolucionário projeto de incentivo à leitura no Morro do Alemão, foi finalista do Prêmio Jabuti 2018.

Paulo Mancha

Duas comemorações de 100 anos para a NFL

A principal liga de futebol americano do mundo está comemorando o centenário da sua fundação. Também aconteceu uma celebração parecida em 2019. Paulo Mancha, autor de Os guerreiros da NFL (com Eduardo Zolin) e Touchdown!, explica que essa é uma pegadinha da matemática: “A fundação foi em 17 de setembro de 1920, ano do primeiro campeonato. Fazendo as contas, a temporada 2019 foi a centésima, então, a gente comemora duas vezes”.

Na década de 1990, Paulo estava desanimado com o futebol da bola redonda por episódios de corrupção e jogos com placar no 0 X 0. Foi quando a TV por assinatura chegou ao Brasil e ele descobriu o futebol americano. “Entendi que era muito mais parecido com xadrez, cheio de estratégias, do que só pancadaria”. Ele se apaixonou, começou a pesquisar mais sobre o esporte e hoje, além de autor, é comentarista da NFL.

Panda News – Como a liga está lidando com duas comemorações?

Paulo Mancha – Aconteceram várias celebrações no ano passado e muitas festas estavam previstas para 2020, o que não aconteceu por causa da pandemia. Mas eles estão transformando a cidade de Canton, no estado de Ohio, na meca do futebol americano. A NFL surgiu lá, em uma loja de carros, onde dirigentes dos times da época se reuniram para discutir a fundação. Hoje, nesse lugar, fica o Hall da Fama do esporte e há um museu dedicado a ele. Também fizeram uma Universidade do Futebol Americano, só para assuntos científicos ligados ao esporte; um hospital especial para jogadores tratarem lesões; e uma casa de repouso para atletas mais velhos que não têm dinheiro. Se você gosta de NFL, precisa visitar Canton pelo menos uma vez na vida. Eu já fui duas!

E sobre a pandemia?

Um caso muito interessante deste ano é o Laurent Duvernay-Tardif, do Kansas City Chiefs, atual campeão do Super Bowl. Ele é médico e costuma voltar ao Canadá, sua terra natal, para fazer residência nas intertemporadas. Como a NFL ofereceu aos jogadores a oportunidade de não jogar agora sem perder o contrato, o Laurent decidiu ficar em Quebec, na linha de frente contra a Covid-19. A mensagem dele foi: quem for só jogador de futebol americano deve jogar, porque cria um entretenimento necessário para a sociedade neste momento. Já ele é mais importante como médico.

O que você vê de mais curioso nesse centenário?

Há exatos cem anos, os Estados Unidos estavam passando pela pandemia de gripe espanhola, e a liga tinha questões relacionadas ao racismo. No Guerreiros da NFL, conto a história do Massilon Tigers, que era a equipe mais poderosa de Ohio. Ela não participou da criação da NFL, pois perdeu muitos jogadores para a pandemia e outros na Primeira Guerra. Já o racismo, não era um grande debate, como hoje. Jim Thorpe, o primeiro presidente da NFL, era descendente de índios, e o técnico do título de 1920 era negro, Fritz Pollard. Racistas criticavam a liga por esses motivos, até que fizeram um pacto e baniram os jogadores negros e índios a partir de 1933. Foi tão vergonhoso! Isso só acabou em 1946. Hoje, 66% dos jogadores são afrodescendentes, e muitos têm se manifestado contra o racismo, a violência policial e incentivado os progressistas a irem votar, o que não é obrigatório nos Estados Unidos.

Temos poucos livros sobre futebol americano no Brasil. Como é essa produção nos Estados Unidos?

Lá, as livrarias têm prateleiras inteiras com obras de futebol americano. Há lançamentos todos os meses: biografias, história, textos técnicos, de tática, para quem pratica, livros de fotos e até humor sobre o esporte. Também existem romances – autores famosos, como John Grisham, costumam usar o futebol americano como pano de fundo para suas histórias. Um dos motivos para eu escrever foi a vontade de suprir uma necessidade do fã brasileiro de futebol americano, que só conseguia ler alguma coisa se importasse o livro e dominasse o inglês.

Escrever bobagens é um troço danado de bom!

Típica mineira de Belo Horizonte, Fátima Mesquita arrancava riso fácil dos paulistas, que se divertiam com seu sotaque e o seu jeitinho “pão-duro”. Havia se mudado para São Paulo no início dos anos 1990, porque era o curso natural daqueles que procuravam emprego. Ela, que acabou não completando o curso universitário de comunicação, teve que se virar para começar a pagar as contas sozinha. Trabalhou como professora de português no cursinho pré-vestibular Anglo e redatora na rádio Jovem Pan, até se envolver na produção de campanhas políticas. Depois de entregar uma delas no Mato Grosso do Sul, em 1996, foi convencida pelos colegas para dar um rolê no Paraguai. Na bagagem de volta, trouxe seu primeiro computador.

“Aquele trambolho ocupava um espaço danado”, lembra. “Ele precisava, ao menos, ser útil”. O fim do ano era sempre um marasmo para quem, como ela, trabalhava com política. Depois das eleições, em novembro, não pintaria trabalho até meados do ano seguinte. Aos 31 anos, Fátima tinha equipamento e tempo: virou escritora. Do sarro que resolveu tirar dos amigos, nasceu seu primeiro livro. O Manual da pão-durice era tudo aquilo que, pouco depois, consagraria o talento de Fátima Mesquita: original, divertido, curioso e muito gostoso de ler.

Era para ser só uma brincadeira, mas a mineira gostou daquele troço. A estreia de verdade veio em 1998, quando publicou a obra de contos Julieta & Julieta, pela editora Summus, o primeiro livro de literatura lésbica no Brasil assinado com o próprio nome da autora. O mercado editorial se animou e a pressionou para virar romancista, mas não era a praia de Fátima. “Romance é uma coisa meio esquizofrênica”, diz. “Você passa anos convivendo com personagens que só existem na sua cabeça”.

Fátima gostava mesmo era de bobagens da vida real – e decidiu escrever sobre elas. Em visita à Inglaterra, se encantou pela quantidade de livros sobre história e ciências nas prateleiras infantis. Lembrou da infância, e do gosto que tinha em ler coisas como a biografia de Dom Pedro II ou a dinâmica das estrelas e planetas, e até curiosidades sobre o funcionamento dos aparelhos domésticos. Na sua casa, tinha uma estante repleta desses livros de referência, e não havia nenhum tipo de restrição: Fátima e os irmãos podiam folhear à vontade livros de todos os assuntos.

A curiosidade vem do sangue: os pais de Fátima eram grandes entusiastas da cultura geral – o pai estudou medicina, a mãe era poliglota, o avô, jornalista. Se o Jornal Nacional falava sobre a guerra no Líbano, no intervalo era certo que a família abriria o atlas para descobrir tudo sobre aquele país distante. Na era pré-internet da cidadezinha do interior de Minas Gerais João Monlevade, para onde os Mesquitas se mudaram quando Fátima era apenas um bebê, ter uma dúvida era trabalho para detetive! “Só os livros eram capazes de resolver”, lembra.

Foi dessa bagagem que surgiu o Almanaque de puns, melecas e coisas nojentas, sua primeira aventura na literatura infantil. Como sugere o título, tratava-se de um compêndio de fatos e curiosidades sobre essas coisas tão nojentas quanto essenciais que nosso corpo produz. Fátima apresentou o projeto para a Panda Books e a editora apostou. O livro saiu em 2004 e até hoje agrada a garotada: foram 13 mil cópias vendidas.

Na época, ninguém escrevia assim: por fora, bobagens e linguagem leve e solta; no fundo, informações importantes e consistentes. Cansada da caretice das publicações de cultura geral que encontrava por aí, Fátima criou sua própria língua – uma língua bem brasileira, com expressões das mais diferentes regiões do país. “Nojento”, “troço” e “enfezado” estão entre as palavras preferidas dela. Na biblioteca da autora, uma seção todinha é dedicada a livros de referência da linguagem popular brasileira. “Pode parecer fácil escrever essas besteiras, mas não é”, conta. “Exige um trabalho de pesquisa de conteúdo, linguística e construção textual, para deixar a coisa fluida como um riachinho”.

O estilo super original e eficiente de Fátima Mesquita se consagrou em outras oito obras publicadas pela Panda Books: “Almanaque de baratas, minhocas e bichos nojentos” (2005), “Almanaque de corruptos, ditadores e tiranos nojentos” (2006), “A incrível fábrica de cocô, xixi e pum” (2007), “Piratas – Os personagens mais terríveis da história” (2008), “Em busca da meleca perdida” (2011), “Pronto para o socorro” (2013), “Bem bolado” (2014) e “Tem lugar aí pra mim?” (2018).

Apesar de os livros dela serem tradicionalmente classificados como almanaques, ela sugere que o gênero possa ser definido como “não-ficção criativa”. “A função desses livros é abrir portas para a curiosidade das crianças”, afirma. Fátima vende uma média de 10 livros por dia. Em 2015, “Pronto para o socorro” foi editado na Alemanha e, em 2020, na China, junto com “A incrível fábrica de cocô, xixi e pum” e “Em busca da meleca perdida”. Este último é seu best-seller: vendeu 106 mil exemplares no Brasil.

Um último segredo: essa super autora é também a gênia por trás dos comentários que recheiam os livros da coleção Os Clássicos da Panda Books, que traz o texto integral de obras tradicionais com explicações e links bem espertos, para o leitor jovem se situar. Multifuncional, Fátima nunca está com um projeto só. Hoje, divide a rotina entre as notas para os próximos lançamentos da coleção Os Clássicos, os roteiros do seu canal no YouTube – Explicatricks –, a produção de um novo livro autoral e a organização de uma campanha política. Apesar de ter alma bem brasileira, mora com a esposa polonesa no Canadá há 17 anos, em uma vila na região francesa. Conheceu o país no casamento do irmão e, quando voltou, levou um choque com a violência que encontrou no Brasil. Agilizou o processo do visto e se mudou de vez. Tem um ponto de exclamação tatuado no pulso esquerdo, que representa um espanto maravilhoso: “Eu vivo de fazer o que eu aprendi nos meus quatro anos primários: escrever”.